24 de agosto de 2007

Um dia que nasceu pra dar errado, mas não deu...

Acordo e não consigo abrir completamente o olho direito. Penso: "danou-se!" Corro pro espelho e vejo lá que o rosto que tinha começado a desinchar ontem com a medicação anti-inflamatória dobrou de tamanho. Ligo para a dentista e ela pede pra eu estar lá na hora do almoço dela.

Preciso antes passar no banco para sacar uma grana, pois dei todos os meus trocados para a minha irmã ontem. Um amigo do meu irmão que aqui estava me deixa lá evitando que eu ande embaixo do sol forte. No caixa descubro que nenhum dos dois depósitos que deveriam ter entrado ontem na conta, foram feitos. Meu saldo não dá nem pra sacar R$10,00. Saio de lá e vou até o ponto de táxi do qual sempre me sirvo e peço a um dos motoristas que me ajude fazendo a gentileza de me levar até o dentista, mas permitindo que eu pague a corrida na semana que vem. Freguesa freqüente e antiga, ele topa.

No consultório, a menina que brinca no chão da recepção quando chego e sento na sala de espera, não consegue desgrudar os olhos do meu rosto. É, sei que estou meio impressionante.

Logo é minha vez e eu já sento na cadeira chorando. Estresse. A dentista avalia a situação, chama a assistente para que lhe prepare duas injeções e pede para que ela a ajude com o sugador. Eu penso: "Lá vem chumbo grosso"! Sinto a picada da anestesia ao mesmo tempo em que vou me dizendo: "fica calma, fica calma, você confia e acredita plenamente nela como profissional". Mas quando sinto a lancetada na bochecha qualquer possibilidade de auto-controle se esvai. Enquanto sinto apertarem a minha face, ao mesmo tempo que ouço o sugador fazendo um ruído semelhante ao de quem chupa o fundo de um copo de milkshake, as lágrimas correm aos grotões e minha respiração começa a acelerar. Sinal irrefutável que ela chegou: uma crise de ansiedade como há muito eu não fazia.

Começo a fazer sinal de que preciso sentar para respirar, mas ninguém consegue me entender até que começo a escorregar para baixo na cadeira fugindo de tudo. Elas param e eu sento-me. Minha respiração está a milhão, eu sei que vou hiper-ventilar, mas não consigo simplesmente respirar mais calmamente. Minha dentista me faz perguntas que me escuto respondendo claramente, mas nem ela e nem a assistente conseguem entender o que digo. Meu rosto começa a formigar e sei que se não conseguir parar de respirar o próximo ato vai ser desmaiar ali mesmo. Sinto a mão da minha dentista no meu ombro em movimentos circulares e escuto a sua voz dizendo: "calma, fica calma". Vejo a cara de espanto da assistente. Preciso parar com aquela hiper-ventilação a tempo e é então que tampo o nariz e a boca com as duas mãos e fico assim até que respirar se torne imperativo novamente.

Pronto. Consegui debelar a crise. Ainda choro, recebo um copo de água com açúcar, me recosto na cadeira e começo a pedir desculpas para a dentista que me explica que tinha de fazer isso, pois caso contrário eu faria um cisto que acabaria drenando pelo lado de fora, o do rosto. Eu sei, não é a primeira vez que me acontece isso tratando um dente, mas o pânico de dentista está sempre ali me sondando. "É a loucura da pessoa; é porque eu sou louca que faço isso, não por falta de confiança. E eu não quero fazer, eu tento não fazer, mas eu faço sabe? Loucura pura!" São as únicas coisas que consigo repetir. Volto a deitar para ela continuar drenando minha bochecha, mas agora as coisas correm mais tranqüilas. Depois dessa descarga adrenérgica sempre fico meio abobada...

Terminamos e ela me trás em casa, pois não confia que eu consiga sequer chamar o táxi. Eu agradeço.

Passei a tarde terminando de drenar meu rosto, com bochecho de Malvona e apertando mesmo e agora sei que saiu tudo e então vou começar a melhorar.

Mas eu agradeço sabe? Do fundo do meu coração agradeço que esse dia que tinha tudo pra dar errado tenha dado certo e eu esteja aqui em recuperação. Agradeço ao amigo do meu irmão que me deu carona; ao taxista que foi tão generoso; à minha dentista e a sua assistente pela competência e generosidade. À minha irmã que comprou meu remédio, à minha mãe que fez sopinha para me esperar e a Deus, porque tudo poderia ter dado errado, mas não deu. Agradeço também às duas pessoas que não cumpriram o que combinaram comigo, pois assim pude ter uma prova concreta que nesse mundo, o que mais vale é a generosidade.

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