6 de outubro de 2006

 

Terça-feira 14:30 hrs, uma mulher pára o trânsito na Alameda Santos e atravessa trinta e três idosos com idade entre 62 e 83 anos que vão ao cine BomBril para descobrirem que deveriam estar no Cine Unibanco. Toca a mesma mulher atravessar a Av. Paulista e descer duas quadras da Rua Augusta sentido centro com suas "crianças". E como fazer para que nenhum fique pelo meio do caminho já que alguns nunca estiveram por ali e cada um anda no rítmo que a idade e a saúde lhes permite? Resolve então andar à frente do grupo com uma mão levantada, acenando e assim garante, pelas brincadeiras que escuta atrás de si - os idosos começam a cantar: "o que é que a baiana tem", e ela mexe as mãozinhas na cadência da música - e pelas risadas e mãos levantadas dos trauseuntes que vem em sentido contrário ao dela no farol, que sim, está sendo vista por todos.

Em frente ao Boteco BH, na Augusta, teve de parar novamente o trânsito afim de que todos atravessem em segurança, mas uma ignorante: "porque o farol tá aberto pra mim" toca o carro em cima de todos. E então ela grita a pleno pulmões: "Sua burra! Onde é que vai chegar mais cedo por se negar a pisar no breque e esperar alguns minutos para deixar as pessoas atravessarem? Não vai envelhecer não sua ignorante"? A mulher ouviu, pois reduziu muito a velocidade do carro, talvez parando pra olhar em volta de si de uma maneira mais ampla, pela primeira vez na vida. Todos a ouviram, pois quando volta sua atenção para o círculo mais imediato ao seu redor, percebe que parou bem mais do que o trânsito; todos olham para ela. Dane-se! Mexeu com seus velhinhos, mexeu com o lado mais bravo dela.

Todos chegam ilesos ao cinema e vão alegres assistir: "Eu me lembro". Os velhinhos saem desconsolados: "ô filme ruim". Mas não é ruim. São as memórias de alguém e nem todos têm memórias bonitinhas para lembrar, como nem todos enfeitam o que lembrar.

Saem de novo em direção à Paulista para tomarem um chá no Viena - que lhes fez um super desconto e um super atendimento - só que desta vez ela não está só na condução do grupo: o coordenador e a estagiária de psicologia estão com eles agora e, então, o caminhar é MUITO mais tranquilo.

Quando estão novamente aguardando o ônibus que os levarão de volta ao ponto de partida - o Hospital do Mandaqui - escuta duas coisas que lhe chamam a atenção: a primeira é uma das meninas que se disse admirada do jeito resoluto dela de resolver os problemas e conduzir o grupo, pois quando viu que teriam de atravessar a rua pensou: "xiiiiiiii, ela vai ter de parar... Nossa! Ela já parou o transito"! E contou que isso a deixou muito tranquila em estar sob os seus cuidados. A outra foi um comentário feito por uma outra das meninas de que o que ela mais gostava era de sentir que ela tinha prazer em estar na companhia deles; que sentia que ela se divertia com eles do mesmo jeito que eles se divertiam com ela e que tem paciência com eles, o que falta na maioria das pessoas, principalmente nos jovens. A isto ela respondeu prontamente: "as pessoas que não têm paciência consigo mesmas jamais a terão com os outros; sejam eles crianças, jovens ou velhos".

E tudo isso foi propiciado pelo Centro de Referência do Idoso do Hospital do Mandaqui que inclusive disponibilizou um celular - já que ainda não tenho um - para que caso algo acontecesse, eu tivesse como comunicar-me rapidamente e tomar as providências necessárias. Quando o Estado tem vontade, faz as parceiras certas (nesse caso com o Hospital Santa Catarina) e as coisas acontecem beneficiando a população.

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