16 de outubro de 2007

Parte I

Era menina, cerca de oito anos, mas mesmo assim apaixonou-se perdidamente pelo menino de onze anos. Nunca vira nada mais bonito na vida do que aqueles cabelos loiros e aqueles olhos cor de mel complementados por um sorriso amplo e de dentes alvíssimos. Mas descobriu cedo que na vida nada é perfeito: ele estava enamorado de sua prima; aquela tinha a mesma idade que ele.

Aliás, foi na festinha de aniversário dela que o conheceu e descobriu o enamoramento – mútuo - pois ambos não paravam de dançar; juntos. Ao se dar conta disso, pela primeira vez sentiu uma dor aguda no peito que logo se transformou em lágrimas, fazendo com que se isolasse num canto para chorar. Queria quietude para absorver completamente aquele novo conceito que se desenhava: a impossibilidade.

Porém o canto escolhido era na mesma sala e, claro, logo vieram saber o que lhe acontecia. E ela disse. Ainda não sabia que existem coisas que por educação e amor-próprio(?) era melhor serem guardadas para si. Então, como só os adultos sabem fazer, logo providenciaram para que o menino fizesse a gentileza de dançar com ela para que cessasse aquele choro, afinal, não custava nada. Foi assim que descobriu o poder da chantagem emocional e ficou muito feliz com o seu novo super poder.

Numa segunda festa de aniversário da prima, diante das mesmas sensações, lançou mão do mesmo recurso só que agora premeditadamente. O canto foi bem escolhido e as lágrimas cuidadosamente vertidas. O resultado esperado chegou, mas não com o mesmo sabor. Se num primeiro momento ficou contente, isso logo cedeu espaço a certo incômodo, talvez decorrente do fato do menino sequer olhar para a cara dela. Terminada a dança resolveu voltar para o seu estado natural: correndo pela casa com as demais crianças. No entanto, plantara-se nela a suspeita de que forçar a barra não era lá uma coisa muito legal de se fazer...

No entanto era teimosa e houve ainda uma terceira festa de aniversário na qual lançou mão do mesmo recurso. Dessa vez foi a tristeza estampada no rosto da prima, aliada ao fato do rapaz seguir sem olhá-la e dela estar dois anos mais velha, que a fez ter noção absoluta de que tomara o caminho errado. Quis interromper a dança, mas faltou-lhe coragem. Pela primeira vez sentiu vergonha de si mesma. A tortura finalmente terminou, mas dessa vez ela não foi correr. Escolheu um canto afastado do quintal cheio de árvores e sentou para pensar no que acontecia.

Do muito que pensou o que conseguiu concluir do alto dos seus dez anos é que não valia a pena estar com quem não queria estar com ela e muito menos se isso fizesse a infelicidade de alguém; ainda mais se fizesse a infelicidade dos três. Também teve a forte sensação - mas não pela primeira vez - que no mundo não haveria par para ela. Isso doía como só as coisas inevitáveis sabem doer, mas fazer o que? Voltou a correr pela casa com os primos que vieram buscá-la.

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